15. Todas elas juntas (2)

Em busca da musa perdida




Este ano, de 2007, teve início com duas grandes exposições das obras de Leonardo da Vinci: uma em São Paulo e outra em Campinas. Curiosamente, essas exposições tem um mesmo aspecto em comum: a reconstituição de seus projetos inventivos.

Leonardo da Vinci, como se sabe, foi, dentre outras coisas, pintor, inventor, cientista, arquiteto, engenheiro, filósofo e anatomista. Por isso tudo ele é o símbolo de uma época, o renascimento, caracterizada pela valorização da razão e do homem.

No entanto, embora sejamos herdeiros dessa época, hoje dificilmente seria possível surgiu um outro da Vinci. Não porque "não se fazem mais gênios como antigamente", mas pelo fato de que as ciências se especializaram tanto que, nos dias atuais, temos que decidir se queremos ser ou arquiteto ou filósofo ou qualquer outra coisas. E, mesmo para aquele que já se decidiu pela filosofia, por exemplo, haverá de posteriormente ter que decidir entre a filosofia moderna, medieval, clássica, etc.

Claro, todos podem filosofar, utilizar a matemática e ainda ter como hobby pintar quadros. No entanto, para fazer algo novo, isto é, deixar sua contribuição para alguma das áreas do conhecimento humano, exige uma especialização.

Assim, embora existe beleza na proposta renascentista do homem integral cujo desenvolvimento estaria ancorado no equilíbrio entre mente, corpo e espeírito, o fato é que as escolhas profissiionais que temos que fazer hoje em dia frequentemente implia na exclusão de outra área do conhecimento.

Sim, há exceções e eu conheço, inclusive, alguns casos interessantes de pssoas que procuram conciliar duas diferentes áreas do conhecimento. Mas, embora esse seja frequentemtente o caminho para as inovações, esses casos que conheço normalmente estão mais ligados à uma busca romântica por um ideal cuja busca implica em grandes sacrifícios pessoais.

E por falar em romantismo, deixe-me entrar logo no tema que proponho discutir aqui: a música "Todas elas juntas num só ser", de Lenine. Conforme já havia dito anteriormente, ela é uma genial enciclopéida cantada das musas da MPB: de A a Z, como diz um trecho dela.

Escolher é uma qualidade e uma necessidade humana. Pasamos o dia todo tendo que fazê-las, e mesmo quando nos recusamos a fazê-las já estamos, assim, fazendo a escolha de nos adeqüarmos ao que foi estabelecido. Escolher, não raro, implica num sofrimento porque uma escolha imlica em abrir mão de todas as outras possibilidades.

Mas nem toda escolha é uma dor, ao menos em determinado momento do processo. Uma velha canção chamada "As Três Cuiabanas" narra a história de certo homem que, numa viagem a trabalho, viu-se enamorado de três lingas irmãs. Quem dera se todas nossas escolhas fossem assim, não?

Contudo, chega um momento em que temos que decidir: se vamos ficar com todas as musas ou se vamos, enfim, começar a nos relacionar e a conhecer uma delas abrindo, assim, mão de fazer isso com as outras.

E se digo "todas" é porque a música de Lenine fala de musas e não do seu equivalente masculino. Assim, a julgar pela MPB, as musas e a difícil decisão de escolher uma dentre várias beldades parece ser um dilema propriamente masculino. Ou não?...

Não posso, obviamente, falar pelas mulheres. Mas, as vezes tenho a impressão que o sofrimento que elas tem, no seu processo de escolha de alguém parece-me ser mais be fundamentado que os homens que sempre são levados pela ilusão daquilo que vêem. Um texto do livro bíblico que tenho me lembrando sempre que medito nas canções de Lenine, diz algo nesse sentido:

"(...)
Os olhos nunca se saciam de ver,
nem os ouvidor de ouvir".
[Eclesiastes 1:8]

Assim, sob essa premissa, que também faz eco com outro provérbio que diz que "enganosa é a graça e vã a formosura" (Provérbios 31:30), parece-me que aquilo que vemos numa mulher ou ouvimos dela não devem ser os únicos critérios para nossas escolhas amorosas. Claro, servirá muito bem enquanto quisermos tê-las como musas inspiradoras, e aí poderemos "amar" a todas com a mesma intensidade. Mas, se quisermos ir além e escolher uma que seja "todas elas juntas num só ser", então o trabalho será maior.